Existe muita confusão em torno do Hatha Yoga. O subtítulo "o yoga do corpo" apenas aumenta essa confusão ao colocar as coisas de forma tão breve e simplória. Há quem pense que o Hatha Yoga é uma forma inferior de yoga justamente por incluir práticas físicas; isto, aliás, faz com que se acredite que o Hatha Yoga demande complementos ou associações com outros sistemas de yoga ou algo desse tipo. Para iniciar, é útil buscar as definições tradicionais: Hatha Yopa Pradipika (I:1-2)
Nós, ocidentais, estamos próximos da encruzilhada que os pensadores da Índia já haviam alcançado cerca de sete séculos antes de Cristo. Daí a verdadeira razão pela qual nos sentimos embaraçados e ao mesmo tempo estimulados, inquietos ainda que interessados, quando nos deparamos com os conceitos e as imagens da sabedoria oriental. Esta é a encruzilhada que os povos de todas as civilizações atingem, inexoravelmente, no percurso natural do desenvolvimento de suas capacidades e necessidades de experiência religiosa; e os ensinamentos da Índia nos obrigam a conscientizar os problemas de tal cômputo. Contudo, não podemos fazer uso das soluções indianas; devemos entrar nesta nova época â nossa maneira e resolver as questões com nossos próprios recursos porque, embora a verdade - o esplendor da realidade - seja universalmente uma e a mesma, ela é espelhada diversamente conforme os meios que a refletem. A verdade aparece de maneira diferente em cada época e em cada terra de acordo com a idiossincrasia, com a matéria viva na qual se forjam seus próprios símbolos.

Desde o século passado que se realizaram, de ambos os lados, tentativas de diálogo, simultaneamente interessantes e variadas. Alguns ocidentais, ou, grupos de ocidentais, quiseram dar a conhecer o Oriente ao Ocidente e alguns orientais tentaram transmitir ao Ocidente mensagens, experiências, e convicções para se dar a. conhecer à Europa e mostrar a verdadeira face da sua cultura. Por isso é interessante analisar estas tentativas.
No meu tempo de estudante geralmente se considerava que a frase "filosofia indiana" era contraditória, uma contradictio in adjecto, comparável a um absurdo tal como "madeira de ferro”. A "filosofia indiana" era algo que simplesmente não existia, como as "calendas gregas" ou, no dizer dos lógicos hindus, os "chifres de uma lebre" ou o "filho de uma mulher estéril". Dentre todos os professores que ocupavam cátedra de filosofia naquela época, havia apenas um solitário entusiasta, um discípulo da Schopenhauer, o velho Paul Deussen, que regularmente dava aulas sobre filosofias da Índia. É claro que, até certo ponto, os orientalistas proporcionavam informações preparando edições de textos, auxiliados, vez por outra, por um aluno, mas nunca se preocupavam em investigar o problema da existência - ou não - de tal coisa chamada "filosofia indiana". Tudo quanto encontrassem em seus documentos o interpretavam sobre uma base filológica, passando sem delongas para a linha seguinte. Enquanto isso, os outros professores de filosofia concordavam unanimemente - uns de maneira polida, outros nem tanto - que tal coisa como filosofia, no sentido exato do termo, simplesmente não existia fora da Europa. E, conforme veremos, esta atitude tinha suas razões do ponto de vista técnico.